Território indígena e meio ambiente equilibrado

A importância da demarcação de terras indígenas para enfrentar a crise climática e garantir um meio ambiente equilibrado e sustentável

92
Indígena em protesto
Indígena em protesto (Foto: Rafa Neddermeyer/ABr)

Em tempos de emergência climática como o que vivenciamos, com o planeta já em febre e a perda da fauna e flora dos biomas brasileiros por meio de incêndios florestais e desmatamento ilegal, surgem algumas vozes que nos mostram que ainda é possível ter esperança de que faremos algo rápido para conter o estado de coisas. Mas é difícil ter esperança quando, no contexto interno, vemos que os povos indígenas ainda lutam pela demarcação de suas terras, enfrentando inúmeras resistências difíceis de superar.

Uma das formas de conter o colapso climático é ouvir a voz dos povos originários, entendendo que defender a posse de seus territórios é garantir o meio ambiente equilibrado e a possibilidade de vida para as futuras gerações.

Se persistirem a discriminação, o desrespeito e o descaso com a demarcação de terras indígenas, comprometemos não apenas a sobrevivência física e cultural desses povos, mas a própria possibilidade de vida humana na Terra.

A Constituição de 1988 assegurou o direito à diferença dos povos indígenas, o respeito à sua organização social, línguas, costumes, tradições e crenças, além de estabelecer que os direitos dos indígenas sobre as terras que ocupam são originários. Também a Declaração Universal dos Direitos dos Povos Indígenas, da Organização das Nações Unidas, dispõe sobre os direitos culturais e étnicos coletivos, o direito à terra e aos recursos naturais, a manutenção das estruturas econômicas e modos de vida tradicionais, o direito consuetudinário e o direito coletivo à autonomia.

Espaço Publicitáriocnseg

Mesmo com todos os direitos conquistados, os povos indígenas brasileiros ainda estão vulneráveis, confinados em territórios cada vez mais cercados pelas motosserras ou pelos tratores do agronegócio, revelando que o antigo projeto de “aldeamento” não deixou de existir, dada a persistência das violações à propriedade coletiva e à integridade física desses povos.

O artigo 231 da Constituição brasileira reconhece como preexistente o direito dos indígenas sobre suas terras, e a demarcação tem natureza meramente declaratória. Ou seja, o que se busca é apenas a regularização das terras, evitando colocar em risco a integridade e a sobrevivência dos povos indígenas.

Em 2023, em julgamento emblemático, o Supremo Tribunal Federal (STF) afastou a tese do “fato indígena”, julgando inconstitucional o “marco temporal”. Pela tese do marco temporal, os povos indígenas só poderiam reivindicar terras que ocupavam até a data da Constituição de 1988.

Logo após, foi editada a Lei 14.701/2023, pelo Congresso Nacional, que, em sentido diverso ao julgamento do STF, restabeleceu o “marco temporal” com a derrubada do veto presidencial sobre a questão.

Criou-se, com isso, um impasse: se o Congresso Nacional poderia promulgar uma lei sobre matéria já julgada inconstitucional pelo STF, ou se o STF julgou uma matéria que já vinha sendo objeto de discussão legislativa, antecipando-se à votação no Congresso e imiscuindo-se na esfera legislativa. A discussão é objeto de Ação Direta de Constitucionalidade no STF (ADCT 87/DF), sendo que o ministro Gilmar Mendes criou uma comissão especial que visa a um consenso para o anteprojeto de lei complementar, elaborado a partir das sugestões de todos os participantes.

Espera-se o sucesso na formalização desse consenso, e que ele seja favorável ao direito dos povos indígenas sobre suas terras. É necessário que esses povos continuem com suas atividades produtivas, culturais e ancestrais, transmitindo seus ensinamentos, sua resiliência e sua capacidade de preservação dos recursos ambientais necessários ao seu próprio bem-estar — onde reside, também, a possibilidade de sobrevivência de todos.

Uma compreensão holística de que o meio ambiente equilibrado compreende o direito à demarcação das terras indígenas é um bom começo para demonstrar que estamos ajudando a evitar não apenas retrocessos normativos, mas também o caos climático e o desequilíbrio ambiental com os quais estamos nos deparando.

Siga o canal \"Monitor Mercantil\" no WhatsApp:cnseg

DEIXE UMA RESPOSTA

Por favor digite seu comentário!
Por favor, digite seu nome aqui