Três perguntas: a energia solar e a matriz elétrica brasileira

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Ana Carolina Katlauskas Calil (divulgação TozziniFreire Adv)
Ana Carolina Katlauskas Calil (divulgação TozziniFreire Adv)

Segundo o Balanço Energético Nacional 2021, ano-base 2020, preparado pela Empresa de Pesquisa Energética (EPE), as principais fontes de energia da matriz elétrica brasileira, que contribuíram para a oferta interna disponibilizada à população de 645,9 TWh (terra-watt hora), foram a hidráulica (65,2%), biomassa (9,1%), eólica (8,8%) e gás natural (8,3%). A participação da energia solar passou de 1,0% em 2019 para 1,7% em 2020, atingindo 10.750 GWh (giga-watt hora) de geração elétrica, um crescimento de 61,5% comparado a 2019, o maior registrado entre todas as fontes de energia da matriz elétrica brasileira.

No total, as fontes de energia renováveis representaram 84,8% da matriz elétrica brasileira, comparado a 23,0% do mundo em 2018 e 27,0% dos países da Organização para Cooperação e Desenvolvimento (OCDE) em 2019.

Conversamos sobre o mercado brasileiro de energia elétrica solar com Ana Carolina Katlauskas Calil, sócia na área de energia do escritório TozziniFreire Advogados.

 

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Como você está vendo o mercado brasileiro de energia solar e suas perspectivas?

Hoje é possível observar que o mercado de energia elétrica brasileiro está passando por um processo lento de reformulação, tal como ocorre, ou já ocorreu, de forma parcial em outros países. Esse processo é pautado por duas diretrizes básicas: a transição energética e o aumento do protagonismo do consumidor para escolha de como garantirá sua demanda de energia elétrica.

Em linhas gerais, no campo da energia elétrica, o processo de transição energética pode ser traduzido pelo fomento da utilização de fontes renováveis, desde que pautada em processos que garantam sustentabilidade. Por sua vez, o protagonismo do consumidor será intensificado a partir de medidas que possibilitem ao consumidor a livre escolha de seu fornecedor de energia elétrica.

Atualmente, é possível observar essas duas diretrizes ganhando força no Brasil. Diversas empresas tanto na indústria de energia como de outros nichos de mercado vêm optando por atuar com fontes renováveis, seja pela alteração de seu portfólio de ativos ou pela aquisição de energia elétrica proveniente de fontes limpas, em relações de longo prazo.

Já no que diz respeito ao protagonismo do consumidor, as discussões legais e regulatórias diárias a respeito da geração distribuída, expansão do Mercado Livre, autoprodução, usinas virtuais, microrredes, “sandboxes tarifários”, dentre outros temas semelhantes, apenas garantirão maior segurança jurídica para estruturas diferenciadas de produção/aquisição de energia quando em comparação com a compra no Mercado Regulado.

E é justamente nesse cenário otimista de reformulação da indústria de energia elétrica brasileira que se insere o fortalecimento e crescimento da fonte solar na matriz energética. Com a bandeira da transição energética e com expectativas regulatórias quanto ao aumento do protagonismo do consumidor, espera-se não apenas o crescimento da fonte em nosso mercado como sua democratização.

 

Segundo o Operador Nacional do Sistema Elétrico, a energia solar representa 2% da matriz elétrica brasileira, podendo chegar a 2,9% até o final de 2021. Como você avalia a participação da energia solar na matriz elétrica brasileira e o contexto da crise hídrica que ameaça o fornecimento de energia no Brasil?

Apesar da pequena representatividade atual da fonte solar na matriz brasileira, deve ser destacado o potencial de rápido crescimento da fonte em nosso mix energético que, de acordo com o Balanço Energético Nacional 2021 produzido pela Empresa de Pesquisa Energética (EPE), cresceu 61,5% quando em comparação com o ano de 2020.

Exemplo disso pode ser inclusive observado quando avaliamos projetos de geração distribuída: segundo dados da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), hoje, quase 10 anos após a edição da regulamentação da Aneel sobre GD, há 580.543 unidades consumidoras com sistemas de GD solares instalados, o que representa 6.680 MW para o país.

E como a fonte solar se insere na atual crise energética e hídrica que o país está passando? Como amplamente noticiado, o país está passando nesses últimos meses pela maior crise hídrica desde 1931, e isso, é claro, vem impactando nosso setor de energia elétrica, predominantemente hidrotérmico. No início de setembro, já tínhamos conhecimento da implantação do mecanismo de redução voluntária da demanda, aplicável a consumidores livres de energia e agregadores, e do aumento da tarifa de energia elétrica a partir da criação da Bandeira de Escassez Hídrica.

Esses fatores aliados à definição do marco legal de geração distribuída e ao crescimento de medidas regulatórias para intensificação do protagonismo do consumidor apenas incentivarão o crescimento da fonte solar na matriz energética nos próximos anos.

 

Como você está vendo a constituição do mercado legal da energia solar no Brasil?

Como amplamente divulgado no mercado, no dia 18 de agosto, a Câmara dos Deputados aprovou o conteúdo do Projeto de Lei 5829, responsável por definir o marco legal da geração distribuída no País. O projeto de lei em questão é resultado de esforços de conciliação entre autoridades governamentais e agentes setoriais e, em linhas gerais, propõe:

(i) avaliação dos custos e benefícios que projetos de geração distribuída proporcionam ao sistema nacional pelo Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) e pela Aneel;

(ii) remuneração gradativa no universo de 6 anos do uso da rede de distribuição;

(iii) regime de transição para projetos existentes ou que já tenham solicitação de acesso até o final de 2045;

(iv) regras sobre a necessidade de apresentação de garantia de fiel cumprimento de 2,5% a 5% em favor de distribuidoras para determinados tipos de projetos de geração distribuída.

A partir desse momento, o Projeto de Lei deverá ser deliberado pelo Senado e, posteriormente, passará para aprovação presidencial. Com a publicação do PL em lei, espera-se não apenas finalizar uma discussão setorial que dura há anos como também, consequentemente, garantir maior segurança jurídica para o desenvolvimento de projetos de GD. Ao conferir maior previsibilidade a projetos dessa natureza, garante-se um ambiente mais seguro para condução e intensificação de investimentos.

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