No último dia 12, o Conselho Monetário Nacional, através da Resolução 4.888, postergou a entrada em vigor das novas condições e procedimentos para a realização de desconto de recebíveis estabelecidas através da Resolução 4.734 de 27/6/2019. Essa data passou de 17 de fevereiro para 7 de junho. A postergação tem como objetivo dar mais tempo às entidades registradoras para que elas possam fazer os testes homologatórios dos novos sistemas.
A remodelagem do mercado de crédito, que está sendo conduzida pelo Banco Central, tem como objetivo melhorar o ambiente das garantias no Brasil. Diga-se de passagem, esta mudança faz parte da Agenda BC#, responsável pela implementação do Pix e do Open Banking. Essa mudança impactará diretamente as empresas que possuem recebíveis de cartões de crédito e que hoje somente podem antecipá-los com a empresa responsável pelo processamento da operação. Com a remodelagem, as empresas ficarão livres para antecipá-los com os credores que oferecerem as melhores condições de antecipação.
Para entendermos melhor essas mudanças, conversamos com Paulo David, fundador da Grafeno, fintech que oferece contas digitais e que em breve oferecerá infraestrutura de registros eletrônicos para empresas e credores.
O que é a Agenda BC#?
A Agenda BC# é uma iniciativa do Banco Central do Brasil para desenvolver inovações estruturais no sistema financeiro do país. Ela tem 5 dimensões: inclusão, competitividade, transparência, educação e sustentabilidade. Cada dimensão reúne projetos que são transformadores para o ambiente de negócio do país. São projetos que podem remodelar o mercado, reduzindo o custo do crédito, aumentando a competitividade entre incumbentes e novos entrantes, e trazendo mais transparência e segurança.
O Pix, lançado em novembro, é uma iniciativa da frente de Competitividade da Agenda BC#. Em 2021, a Agenda BC# deve avançar nas frentes de open banking e de registro eletrônico de ativos financeiros. São iniciativas que favorecem a inclusão de mais brasileiros, e de mais empresas no sistema financeiro. No caso das empresas, tem-se um crescimento no número de players criando e ofertando infraestrutura financeira, e também um volume maior de empresas conseguindo acessar capital. Isso beneficia o mercado, que fica mais inovador e mais competitivo. A agenda BC# é a continuação do projeto Agenda BC+, iniciado em 2016.
Como funciona o mercado de recebíveis atualmente?
O uso de recebíveis para acessar capital de giro é muito disseminado no Brasil. As empresas fazem antecipação para receber a vista o que elas venderam a prazo. Os principais recebíveis negociados no sistema financeiro e no mercado de capitais são duplicatas e crédito de cartões.
No caso dos recebíveis de cartões, a empresa hoje só pode negociar a antecipação do crédito com a adquirente, ou seja, a dona da maquininha. Essa regra do mercado só favorece as adquirentes. As empresas, que usam as maquininhas, não tem poder de barganha para negociar taxas e condições, uma vez que elas não podem vender a carteira de recebíveis para mais ninguém.
Já com duplicatas, as empresas possuem um pouco mais de flexibilidade, haja vista a disseminação de fundos de crédito, fintechs, factorings e bancos de todos os tamanhos. As vendas com recebíveis no Brasil, em 2020, alcançaram quase R$ 3 trilhões, sendo que menos de R$ 1,5 trilhão é antecipado.
Como o mercado vai funcionar depois da remodelagem?
Quando entrar em vigor a regulamentação do Banco Central que determina que os recebíveis (tanto os provenientes de cartões, quanto o de duplicata) precisarão ser registrados em uma entidade registradora, as empresas donas dos recebíveis poderão negociar esses ativos com muito mais credores. O mercado fica mais competitivo, uma vez que haverá mais empresas ofertando crédito com base em carteiras de recebíveis de cartões. E as empresas – varejistas, e-commerces, empresas de tecnologia – poderão antecipar os seus recebíveis com quem oferecer as melhores condições. Ou seja, o mercado fica melhor para quem acessa crédito e para quem dá crédito.
O registro de recebíveis viabiliza essa transformação no mercado por uma questão: ele gera transparência e segurança. Um ativo registrado é um ativo que foi individualizado, registrador e, portanto, é único. Em diversos países, a entrada em vigor das entidades registradoras trouxe menos fraude e riscos, ao passo que empresas má intencionadas não podem, por exemplo, vender a mesma carteira de recebíveis ou ativo para mais de um credor, nem podem gerar ativos sem lastro.
Leia mais:
Mercado diminui projeção para crescimento da economia em 2021