O mercado de criptomoedas seguiu em queda em junho de 2021. Tomando como referência o bitcoin, principal criptomoeda deste mercado, vemos que depois de atingir sua máxima histórica em meados de abril, R$ 368 mil, ele iniciou um movimento de desvalorização que segue até o momento. Depois de fechar abril cotado a R$ 317 mil, o bitcoin sofreu uma forte desvalorização em maio, terminando o mês cotado a R$ 190 mil. Em junho, a desvalorização do bitcoin seguiu seu curso, fazendo com que a moeda digital fechasse abaixo dos R$ 175 mil.
Conversamos sobre mercado de criptomoedas em junho de 2021 com Rodrigo Soeiro, fundador da Monnos, rede social de investimentos focada neste mercado.
O mercado de criptomoedas seguiu se desvalorizando em junho. Na sua opinião, este mercado é especulativo ou ele possui fundamentos?
A criptoeconomia é ainda incipiente quando comparada à capitalização de mercado das bolsas globais – estamos falando de 1,3 trilhão da criptoeconomia contra 67 trilhões de dólares do mercado das bolsas globais, ou seja, menos de 2%. Em um universo tão reduzido, é certo que teremos muita volatilidade, e algumas delas provocadas por motivos fúteis (como tuítes, por exemplo). Na medida em que a criptoeconomia vai se fortalecendo, esses movimentos vão se tornando cada vez mais irrelevantes.
Mas é muito importante não se deixar levar por estes “pirotecnismos” momentâneos, como as notícias que expõem movimentos repentinos, para cima ou para baixo, e também como as moedas “da moda”, que não têm um propósito claro. Este segmento embarca um movimento muito maior, de altíssimo impacto no sistema financeiro tradicional, que certamente veio para ficar, e que está crescendo exponencialmente – para o desespero dos reguladores, de forma descentralizada, o que gera ainda maior desafio de controle.
Esse tema não é simples e demanda estudos. Para compreender os fundamentos existentes no universo da criptoeconomia é importante conhecer o propósito de cada moeda. Todas elas têm um documento que expõe seu objetivo, chamado whitepaper. Ali você encontra o histórico das pessoas que a iniciaram, sua robustez técnica e, principalmente, o rumo que ela pretende ter ao longo do tempo. A partir disso, sua capacidade de execução é que determinará seu valor sob as regras mais justas existentes, em um exercício de oferta e demanda.
Em junho, El Salvador se tornou o primeiro país do mundo a aceitar o bitcoin como moeda de curso legal, além do dólar americano. Como você viu esse acontecimento?
A adoção do Bitcoin como moeda local por El Salvador é um passo pioneiro e que traz uma série de desafios e oportunidades para esse pequeno país. Os principais desafios são:
– a necessidade de aumentar a distribuição local de acesso à internet;
– a rápida imersão em aspectos regulatórios mínimos, para evitar que a iniciativa se perca em discussões vazias sobre um tema tão novo em todo o mundo;
– a necessidade da manutenção do dólar como moeda referência, por ser menos volátil, e aceitar o bitcoin como moeda de pagamento.
Com relação aos benefícios, são eles:
– a atração de cérebros, empresas e, consequentemente, a geração de empregos. Para citar alguns exemplos, estamos falando de mineradores, empreendedores em geral e pessoas que já estão envolvidas neste ecossistema, que buscam redutos “crypto friendlys” para seguir desenvolvendo de forma segura;
– a possibilidade de reservas de valor nacionais não depreciáveis, além de alto potencial de valorização relevante ao longo do tempo;
– o fortalecimento do turismo, pois passa a ser um dos países pioneiros a absorver uma disrupção que move e mexe com o imaginário de milhões de jovens e empreendedores. Certamente se tornará destino de eventos e de viagens de estudiosos que desejam entender os impactos da decisão;
– o envolvimento de toda a população em um ecossistema permeado por alternativas de ganho de saúde financeira acessíveis e sem intermediação.
A meu ver, para toda a economia frágil e/ou dolarizada, esse é um movimento acertado, tendo em vista também que a própria população tende a já estar fortemente posicionada em criptomoedas.
Na Europa, o Banco Nacional da Suíça e o Banco da França estão se preparando para começar a liquidar pagamentos entre bancos centrais com moedas digitais. Como você avalia esse movimento e suas perspectivas?
A iniciativa da Suíça e da França corresponde à emissão de moedas digitais por Bancos Centrais, também conhecidas como CBDCs (Central Bank Digital Currency). Isso faz com que os dois países tenham moedas locais digitalizadas.
O maior desafio não é a associação com a criptoeconomia, pois a única similaridade entre estes dois mundos está na velocidade e na facilidade das transações. O desafio será entender qual será o papel dos bancos, pois a guarda do recurso digital passará a estar sob a tutela do Banco Central, e não mais dos bancos tradicionais – situação que “corta” drasticamente um canal de receita relevante dos bancos, que movimentam o recurso parado em conta-corrente para a oferta de crédito e outros serviços. Serão os bancos que terão que repensar seu papel e sua forma de atuação junto à sociedade.
Os CBDCs tendem a empoderar ainda mais o universo cripto. Eles obrigarão os bancos a se posicionarem como as fintechs. Se não for isso, eles morrerão sem fôlego. Irônico, mas verdadeiro.
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Gostei muito desse texto, muito centrado, instrutivo e cheio de informações úteis e coerentes nesse universo tão novo e porque não dizer altamente volátil da economia digital. Parabéns ao autor dessa matéria.