As carnes na cesta básica atrapalham a reforma tributária. Segundo o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, ao retornar de reunião com o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira, nesta terça-feira, incluir as carnes pode elevar a alíquota geral do Imposto sobre Valor Adicionado (IVA) em 0,53 ponto percentual, de 26,5% para 27,03%. Esse é o impacto calculado pela Receita Federal, caso o Congresso isente a proteína na regulamentação da reforma tributária.
Ou seja, está parecendo com a história do filme Marvada Carne, de 1985, dirigido por André Klotzel, que mostra a dificuldade, na época, da população pobre de comer carne bovina. No filme, o personagem Nhô Quim sonha em comer carne de boi, entretanto tudo tem um preço: casar com Carula.
Estimativa
Essa estimativa é um pouco inferior à do Banco Mundial, que calcula impacto de 0,57 ponto percentual no IVA. Caso o Congresso inclua a carne na lista de exceções, o Brasil terá a maior alíquota do mundo de IVA, superando a Hungria, que tem alíquota de 27%. Pelo modelo da reforma tributária, a inclusão de exceções, como alíquotas mais baixas e regimes especiais, eleva a alíquota para os demais produtos.
Nesta noite, a Câmara vota a urgência do projeto de lei complementar que regulamenta a reforma tributária. Nesta quarta-feira, às 10h, está previsto o início da votação do mérito do projeto pelo Plenário da Casa.
“Hoje foi feita uma apresentação detalhada de como esses cálculos são feitos para dar segurança para os deputados de que a Fazenda está cumprindo o seu papel. A decisão política é do Congresso Nacional, é quem vai dar a última palavra sobre a reforma, mas o Congresso não vai poder dizer que não prestamos as informações devidas [sobre o impacto de eventuais mudanças no projeto]”, declarou Haddad.
De acordo com Haddad, a desoneração das carnes é o principal entrave para a votação do projeto. Embora Lira tenha desistido da intenção de incluir a carne na cesta básica com alíquota zero, a bancada ruralista continua a articulação para reincluir o ponto no texto.
A Associação Brasileira de Supermercados (Abras) sustenta que a desoneração das carnes na cesta básica não comprometerá a alíquota padrão do IVA. De acordo com os dados da associação, as proteínas de origem animal representam 10,3% das vendas totais nos supermercados. Na proposta de cesta básica nacional isenta sugerida pela entidade, as carnes e os peixes juntos correspondem a 8,5% das vendas totais. Os estudos indicam que a eliminação da alíquota para as proteínas resultaria em um aumento de apenas 0,18 ponto percentual, elevando a alíquota de 26,5% (PLP 68/24) para 26,68%.
A Abras argumenta que o país e a sociedade só têm a ganhar ao isentar carnes e peixes. A pequena renúncia de arrecadação fiscal se justifica pelo ganho em saúde geral da população. Especialmente para as famílias de média e baixa renda, que compõem cerca de 90% da população, a isenção de tributos sobre as proteínas de origem animal será crucial. Além disso, a arrecadação total com o novo imposto corresponderia exatamente ao que se arrecadou em 2023 com a soma dos impostos de consumo, ou seja, R$ 1,2 trilhão, incluídos todos os tributos a serem pagos pelos demais produtos vendidos no varejo alimentar.
Armas
Outros pontos polêmicos são a exclusão de armas e munições e a inclusão de carros elétricos no Imposto Seletivo, tributo que incidirá sobre produtos que façam mal à saúde ou ao meio ambiente.
“Em relação às armas, o impacto [sobre a arrecadação do governo] é pequeno. O tema é relevante, mas vamos distinguir temas relevantes de impactos relevantes sobre a alíquota. São coisas diferentes. Tem coisa muito sensível, que é simbólica. E tem coisa que impacta a alíquota geral. As duas são relevantes, mas evidentemente a que impacta a alíquota geral [como as carnes] recebe uma atenção maior neste momento do Colégio de Líderes”, acrescentou Haddad.
Uma ideia em discussão, informou Haddad, é o aumento no cashback, devolução de tributos a famílias incluídas no Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal (CadÚnico) para compensar a manutenção da carne na lista de produtos com alíquota reduzida para 40% da alíquota cheia. A regulamentação do mecanismo de ressarcimento também está incluída no projeto de lei complementar.
“O cashback está sendo discutido. Aumentar a parcela do imposto que é devolvida para as pessoas que estão no cadastro único. Isso é uma coisa que tem efeitos distributivos importantes. Então, às vezes, não é inventar toda a carne, mas aumentar o cashback de quem não pode pagar o valor cheio da carne. Então, foi discutido tudo isso com muita tranquilidade”, completou o ministro.
Matéria editada para incluir comentário da Abras.
Com Agência Brasil