Una pizza, per favore!

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Assim que a pandemia da Covid-19 começou em Wuham, na China, especulou-se que o vírus teria sido transmitido ao homem por meio da carne do morcego, muito apreciada por lá nos “mercados banhados”, isto é, mercados onde os animais são esfolados vivos (a expressão “banhado” é alusão ao fato de que o sangue dos animas se mistura à água corrente usada para lavar as vísceras). Para os chineses, a carne de morcego é afrodisíaca, e o bicho pode ser comigo na sopa ou à caçarola, uma espécie de guisado em que entram vegetais diversos e batata.

A exótica gastronomia chinesa é muito conhecida. Os chineses explicam que essa opção nasceu nos grandes períodos de fome na década de 30 e, também, por recomendação da medicina popular, que atribui à carne desses bichos poderes afrodisíacos e curatórios. Um dos pratos mais finos e, claro, mais caros, é a sopa de andorinha. O prato, raríssimo, é preparado com a saliva da ave. Um quilo de ninho de andorinhas chega a custar US$ 10 mil, e uma tigela dessa guloseima pode custar US$ 60. Dentre outras “iguarias”, os restaurantes chineses costumam servir ratos, cães, morcegos e insetos. O rato não é monopólio da gastronomia chinesa. É também muito apreciado em outros países da Ásia como a Tailândia e o Vietnã. Carne de cão é comida também na Coreia e nas Filipinas.

Num fino jantar chinês, você pode ser surpreendido logo no primo prato, isto é, na entrada: uma omelete de larvas de bicho da seda temperadas com fatias de cebola frita e ovos de galinha. Como tira-gosto, enquanto você espera a sua vez no cabeleireiro, podem servir-lhe um petisco de escorpião e barata espetados numa delicada varetinha de bambu.

Não é só por seus ingredientes exóticos que a culinária chinesa é conhecida. A forma de prepará-los, ou degustá-los, também não fica nada a dever. Os “camarões bêbados” (zui xia), por exemplo, são servidos crus. Os crustáceos são mergulhados numa bebida alcoólica, geralmente a baijiu. Enquanto ainda estão “sóbrios”, os bichos tentam pular da tigela, e o cliente tem de “pescá-los” no ar para comê-los. Depois de algum tempo, a bebida alcoólica começa a fazer efeito, e os animais se acomodam no fundo do recipiente e são mastigados vivos.

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Outra iguaria é o “ying yang yu”, ou “peixe vivo e morto”. Ainda vivo, o peixe é jogado rapidamente num tacho de óleo quente e servido enquanto a cabeça ainda se mexe. O mergulho no óleo fervente deve ser rápido, apenas para flambar a carne, mas sem danificar os órgãos internos porque o peixe deve continuar vivo por pelo menos mais meia hora, tempo que o cliente leva para se empanturrar e falar de negócios. Cobras vivas são outra especialidade dos chefs chineses. Assim como o “peixe vivo e morto”, as cobras devem ser apenas banhadas no óleo quente para que o cliente as saboreie enquanto ainda se contorcem. Cabeça, pele e espinhas são removidas rapidamente pelo chef e a cobra é comida praticamente crua.

Apesar de banido no país, o “huo jiao lu”, ou “carne de burro vivo”, ainda pode ser encontrado em algum restaurante sofisticado, principalmente em Wuham, onde o coronavírus nasceu. O animal é amarrado pelas patas, vivo, de cabeça para baixo, e o chef vai tirando os pedaços de carne e servindo ao freguês. Outro canapé também mito procurado é o “cérebro cru de macaco”. Prato caríssimo, somente para bolsos privilegiados, muito comum em Guangdong, antiga Hong Kong. Amarra-se o macaco pelo pescoço em uma mesa e os clientes comem o seu cérebro cru, com o animal ainda vivo. O “san zhi er”, ou “filhotes de rato”, é consumido nas províncias do interior da China. Comem-se filhotes de ratos crus. O prato é apreciado porque a carne dos ratinhos é tenra e os ossos fáceis de triturar na mastigação. Filhotes de pato também têm sua importância na degustação. Devem ser comidos vivos, enquanto ainda estão nos ovos.

O jornal italiano Corriere della Sera informa na edição de 10/4 que um decreto do Ministério da Agricultura e dos Negócios Rurais chinês aumentou a lista dos animais que não mais poderão ser comidos no país. A partir desse decreto, cães e gatos já não podem mais ser comidos. Suspeita-se que também sejam agentes transmissores do coronavírus, e não apenas os simpáticos morcegos, como antes se pensava. É a primeira vez que cães e gatos, tidos no Ocidente como animais de estimação, entram na lista da gastronomia proibida. Até então, eram especiarias muito procuradas em restaurantes de luxo e casas de gente de posses. Além deles, outros 18 animais não podem ser comidos, como o camelo, a alpaca, a avestruz, o faisão, o lobo e a marta.

O jornal informa, ainda, que a China fatura cerca de 25 milhões por ano apenas com carne de cachorro. Em fevereiro, o Comitê permanente da Assembleia Legislativa de Pequim proibiu o consumo de carnes de animais selvagens por suspeita de que também possam disseminar o coronavírus, e revogou todas as licenças anteriormente existentes. Segundo Martina Pluda, diretora da seção italiana da Humane Society International, organização internacional de proteção aos animais, cerca de 20% dos chineses consomem carne de cachorro. A mesma organização estima que, por ano, cerca de 10 a 20 milhões de cães são mortos na China por causa da sua carne.

 

Mônica Gusmão é professora de Direito Empresarial, do Consumidor e do Trabalho.

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