Como eu já dizia recentemente, há uma aposta de grandes países produtores de vinhos no aumento do consumo de vinhos por parte dos brasileiros. Para alguns, isso ainda é uma aposta; para outros, já é realidade, pois, apesar de nosso consumo per capita ainda ser bem inferior à média, somos gigantes e, em volume, não é tão pouco assim. Grandes eventos que já estão na agenda nacional são destinados, em parte, à abertura de novos negócios de importação. Chile, Argentina e Portugal são os países mais importados, e o Brasil responde por uma boa fatia de suas receitas em vendas de vinhos.
O evento “Vinhos de Portugal 2025”, divulgado no último artigo, trouxe muitos produtores de várias áreas do país, alguns já importados e outros em busca de seus espaços, já que, em se tratando do país com a mais alta taxa de consumo per capita mundial (61,1 l em 2024), os portugueses já estão no seu limite. A exportação é vital, e o Brasil os recebe muito bem. Segundo dados da Vini Portugal 2025, o Brasil é o segundo país no ranking de importadores de seus vinhos, após os EUA e, se analisarmos os números sem a categoria de Vinho do Porto, ele é o primeiro mercado de destino dos vinhos portugueses.
Estive na feira dos Vinhos de Portugal 2025 com menos tempo do que eu gostaria para explorar todas as regiões, mas participei de duas outras programações interessantes envolvendo vinhos portugueses, nas quais foram apresentados alguns rótulos das regiões de Setúbal e Tejo. A primeira, “Setúbal, onde o rio encontra o mar”, encerrou a programação do Rio Wine & Food Festival 2025, no dia 10 de junho, envolvendo um jantar harmonizado no Restaurante Bota, na Marina da Glória.
A segunda, que aconteceu no dia seguinte como parte da programação da Caravana do Tejo 2025, inclui visitas a sete capitais brasileiras e foi iniciada no Rio de Janeiro, contando com a presença de alguns produtores do Tejo. Também envolveu um almoço harmonizado, tipicamente português, na Mercearia da Praça, em Ipanema. Ambas foram conduzidas pelo especialista Marcelo Copello.
E qual é o foco das duas iniciativas? Alargar o mercado dos vinhos portugueses por aqui e estimular visitas enoturísticas dos brasileiros, dando a conhecer melhor seu território e evidenciando que essas regiões têm uma vitivinicultura ativa, com diversidade e qualidade. Isso se faz necessário, especialmente porque há um prestígio já mais consolidado por parte de regiões como Alentejo, Douro, Vinhos Verdes e até mesmo Dão, enquanto as demais ainda se sustentam por grandes marcas mais tradicionais, mas que nem sempre representam o que há de melhor ou mais exclusivo da produção local. Busca-se expandir a noção dessa produção.
Este é o caso bem explícito da Península de Setúbal, região de forte tradição vitivinícola, que fica a sudoeste do país, onde as primeiras vinhas foram plantadas em torno de 2.000 a.C. Um dos ícones da produção portuguesa vem dali: o Moscatel de Setúbal, um vinho fortificado a partir de uvas Moscatel. Embora tenha sido apreciado por algumas cortes reais, acho que este belo vinho ainda é subestimado no Brasil, ofuscado pelos Portos e Madeiras.
Outro vinho de Setúbal, muito popular no Brasil, é o tinto Periquita. Trata-se de uma marca forte e ainda muito apreciada, mas voltada a grandes volumes. Contudo, há rótulos mais exclusivos e que podem ser resultantes de áreas distintas, como da D.O. Palmela, considerada a melhor origem para a cepa Castelão, tinta de mais prestígio da região.
Mas o foco do jantar foi em vinhos brancos, algo surpreendente, especialmente em se tratando de uma região ao sul de um país com predomínio de vinhos tintos. Mas, como o interesse pelos vinhos brancos aumenta e a região quer mostrar sua diversidade produtiva, degustamos apenas vinhos brancos — oito rótulos no total —, varietais e de cortes do seu rico repertório de cepas autóctones.
A noite abriu com o Herdade de Gâmbia Branco, um vinho seco, fresco e aromático, de corte da Moscatel Graúdo, Arinto e Verdelho, que caiu muito bem com o ceviche da casa. Tivemos bons vinhos de corte, como o Herdade da Arcebispa Branco, com 50% de Antão Vaz, complementado por Arinto e Verdelho. O Sacrifício Antão Vaz Grande Reserva, um varietal mais untuoso e complexo, acompanhou bem o atum grelhado, e dois fortificados da Moscatel fecharam o acompanhamento das sobremesas. O último — Reserva de Família Moscatel Roxo Venâncio Costa Lima — me encantou. Essa varietal, rarissimamente encontrada, tem cor rosada e aromas de frutos negros com toques florais.
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