Ter uma parte do lucro líquido das companhias de capital aberto, aquelas listadas na Bolsa de Valores, é o objetivo de muitos investidores. No entanto, especialistas alertam que é necessário ter cuidado com a promessa de ganhos extras. “Dividendos podem ser uma ilusão. As pessoas pensam que esse é um ganho extra, mas o valor é descontado do preço da ação, e ainda há o fato de que a empresa está retirando parte do dinheiro que poderia ser investido para partilhar entre os acionistas, o que pode ter reflexo nos resultados a longo prazo”, alerta Robinson Trovó, gestor de investimentos com duas décadas de experiência e certificações CNPI-T, CFG e CGA.
Ele ressalta que a previsão do pagamento de dividendos está intrinsecamente ligada ao desempenho financeiro da empresa. Se ela está lucrando, a estimativa é que uma parte desse lucro seja repassada aos acionistas, proporcionalmente ao número de ações que possuem.
Ele explica que o pagamento desses rendimentos não garante automaticamente ganhos para o investidor. O preço da ação é descontado pelo valor dos dividendos distribuídos, e os investidores devem considerar essa dinâmica ao avaliar a atratividade de uma ação. Além disso, alerta para a possibilidade de os dividendos pagos pela empresa serem menores do que a desvalorização da ação durante o ano, resultando em prejuízos para o investidor.
“Se parte dos ganhos está sendo distribuída, essa empresa pode perder capacidade de investimento futuro em seu crescimento. Ou seja, isso pode ser interessante para grandes corporações, mas para empresas de porte menor, isso pode significar um crescimento menor no futuro, ou até desvalorização da ação”, diz.
De acordo com ele, um caso que mostra que se deve ter preocupações com ações pagadoras de dividendos foi o que ocorreu com a Intel em 2023. A empresa enfrentou desafios recentes devido à mudança tecnológica; isso fez com que ocorresse um corte no pagamento previsto de dividendos em 66%.
“A empresa estava nas listas que destacam as ‘melhores pagadoras de dividendos’. Isso mostra que empresas que foram boas pagadoras no passado podem não manter o desempenho no futuro devido a mudanças em suas condições internas ou no ambiente de mercado”, alerta Trovó.
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Outra visão: esqueça a valorização
Vicente Guimarães, CEO da VG Research, destaca que existem duas formas de ganhar com ações. A primeira é com a valorização dos papéis, sendo este um foco mais especulativo e incerto. A segunda forma é com os dividendos. “Seguindo esta metodologia, o investidor deve se ater ao foco de crescer seus dividendos, deixando de lado a preocupação com a valorização das ações”, afirma Guimarães.
O economista vai além em sua recomendação ao afirmar que a queda nos preços de ações que pagam dividendos deve ser vista como algo positivo, uma vez que o investidor pode acumular mais ações pagando um preço menor. “No meu ponto de vista, quando o preço cai existe uma oportunidade incrível de acumular boas ações que pagam dividendos. A vantagem de desenvolver uma estratégia de investimentos assim é que esse modelo garante mais previsibilidade”, diz.
Ricardo Schweitzer, analista independente especializado em dividendos, aponta que os investidores que desejam viver de renda passiva devem ter em mente que a maioria das empresas brasileiras não paga dividendos mensalmente. “Muitas distribuem semestralmente e outras trimestralmente. Assim, não é tão trivial montar uma carteira para ganhos mensais, pois isso requer uma estratégia específica para garantir um fluxo de renda regular”, alerta.
Dividendos entre 30% e 60% dos lucros
De acordo Schweitzer, pensando no longo prazo, o investidor deve olhar para setores estáveis e defensivos, e cita como exemplos bancos, energia elétrica, saneamento, telecomunicações e infraestrutura. “Tais segmentos tendem a ser fontes consistentes de dividendos e são menos suscetíveis a flutuações econômicas. É preciso lembrar ainda que as produtoras de commodities podem distribuir bons dividendos sazonalmente, mas não são adequadas a quem quer ou precisa de previsibilidade”, afirma o analista.
Outra dica é sempre observar a capacidade de crescimento dos dividendos, buscando empresas que não apenas pagam dividendos consistentes, mas também têm um histórico de aumento desses dividendos ao longo do tempo. Tais ações podem ser especialmente atraentes para investidores em busca de renda passiva crescente.
“Como nada é tão simples, o passado nem sempre reflete o futuro, e a empresa também deve dar sinais de que vai crescer ao longo dos próximos anos. Seu desempenho depende do reinvestimento de parte dos lucros, que vai alimentar sua manutenção e expansão. Desta forma, como regra geral, privilegie empresas que distribuam entre 30% e 60% dos lucros”, finaliza Schweitzer.
Por Gilmara Santos, especial para o Monitor